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Gravidez não planejada no extremo Sul do Brasil: prevalência, tendência e fatores associados

Resumo

Este estudo estimou a proporção de puérperas que não planejaram a gravidez, avaliou tendência e identificou fatores associados à sua ocorrência no município de Rio Grande-RS. Entre 01/01 e 31/12 de 2007, 2010, 2013, 2016 e 2019 entrevistadoras treinadas aplicaram questionário único e padronizado a todas as puérperas residentes neste município. Utilizou-se teste qui-quadrado para comparar proporções e regressão de Poisson com ajuste da variância robusta na análise multivariável. A medida de efeito utilizada foi razão de prevalências (RP). O estudo incluiu 12.415 puérperas (98% do total). A prevalência de não planejamento foi 63,3% (IC95%: 62,5%-64,1%). Após ajuste, as maiores RP para não planejamento da gravidez foram observadas entre mulheres de menor idade, cor da pele preta, com companheiro, maior aglomeração domiciliar, pior escolaridade e renda familiar, maior paridade e tabagistas. Houve pequeno aumento na prevalência de não planejamento da gravidez no final do período principalmente entre àquelas com maiores riscos de eventos desfavoráveis na gestação e parto. Alcançar estas mulheres nas escolas de ensino médio, empresas, serviços e profissionais de saúde, além de meios de comunicação de massa, pode auxiliar na prevenção desse tipo de gravidez.

Palavras-chave:
Gravidez não planejada; Gravidez não desejada; Fatores de risco; Saúde reprodutiva; Período fértil

Abstract

The study aims to estimate the proportion of puerperae with an unplanned pregnancy, evaluate trends and identify factors associated with its occurrence in Rio Grande-RS, Brazil. Trained interviewers applied a single, standardized questionnaire to all puerperae residing in the municipality in 2007, 2010, 2013, 2016 and 2019. The chi-square test compared proportions and the Poisson regression with robust variance adjustment in the multivariate analysis. The prevalence ratio (PR) was the effect measure employed. The study includes 12,415 puerperae (98% of the total). The unplanned pregnancy rate was 63.3% (95%CI: 62.5%-64.1%). After adjusting, the highest PR for not planning pregnancy were observed among younger, black women, living without a partner, with more significant household agglomeration, lower schooling, and household income, multiparous and smokers. The rate of unplanned pregnancy is high and stable, with a higher propensity among women those with the highest risk of unfavorable events during pregnancy and childbirth. Reaching these women in high schools, companies, services and health professionals, in addition to the mass media, can be strategies to prevent unplanned pregnancy.

Key words:
Unplanned pregnancy; Unwanted pregnancy; Risk factors; Reproductive health; Fertile period

Introdução

Dentre as 213 milhões de gravidezes ocorridas em 2012, a mais recente estimativa disponível, cerca de 85 milhões delas não foram planejadas11 Sedgh G, Singh S, Hussain R. Intended and unintended pregnancies worldwide in 2012 and recent trends. Stud Fam Plann 2014; 45(3):301-314.. Este tipo de gravidez está associado ao início tardio das consultas, a realização de pré-natal inadequado e a resultados adversos como baixo peso ao nascer, prematuridade, necessidade de indução do trabalho de parto e maior tempo de internação22 Dibaba Y, Fantahun M, Hindin MJ. The effects of pregnancy intention on the use of antenatal care services: systematic review and meta-analysis. Reprod Health 2013; 10:50.

3 Shah PS, Balkhair T, Ohlsson A, Beyene J, Scott F, Frick C. Intention to become pregnant and low birth weight and preterm birth: a systematic review. Matern Child Health J 2011; 15(2):205-216.

4 Ticona DM, Huanco D, Ticona-Rendón MB. Impact of unplanned pregnancy on neonatal outcomes: findings of new high-risk newborns in Peru. Int Health 2024; 16(1):52-60.
-55 Carlander A, Hultstrand JN, Reuterwall I, Jonsson M, Tydén T, Kullinger M. Unplanned pregnancy and the association with maternal health and pregnancy outcomes: A Swedish cohort study. PLoS One 2023; 18(5):e0286052.. Além disso, essas mulheres são, em geral, de menor idade, solteiras ou sem companheiro, de baixo nível socioeconómico e, muito frequentemente, vítimas de violência por parceiro íntimo66 Goossens J, Van Den Branden Y, Van der Sluys L, Delbaere I, Van Hecke A, Verhaeghe S, Beeckman D. The prevalence of unplanned pregnancy ending in birth, associated factors, and health outcomes. Hum Reprod 2016; 31(12):2821-2833.,77 Lukasse M, Laanpere M, Karro H, Kristjansdottir H, Schroll AM, Van Parys AS, Wangel AM, Schei B; Bidens study group. Pregnancy intendedness and the association with physical, sexual and emotional abuse: a European multi-country cross-sectional study. BMC Pregnancy Childbirth 2015; 15:120.. Por estas razões, o não planejamento da gravidez constitui um problema de saúde pública mundial88 Khan MN, Harris ML, Shifti DM, Laar AS, Loxton D. Effects of unintended pregnancy on maternal healthcare services utilization in low-and lower-middle-income countries: Systematic review and meta-analysis. Int J Public Health 2019; 64(5):743-754..

Estima-se que 55% dos nascimentos no Brasil não sejam planejados, o que representa cerca de 1,4 milhão de nascimentos/ano99 Theme-Filha MM, Baldisserotto ML, Fraga AC, Ayers S, Gama SG, Leal MD. Factors associated with unintended pregnancy in Brazil: cross-sectional results from the Birth in Brazil National Survey, 2011/2012. Reprod Health 2016; 13(Supl. 3):118.. Entre as brasileiras, além dos fatores já mencionados, foram identificados ainda como significativamente associados a este desfecho cor da pele parda, amarela e preta, aglomeração domiciliar, desemprego, multiparidade, consumo de álcool e tabagismo99 Theme-Filha MM, Baldisserotto ML, Fraga AC, Ayers S, Gama SG, Leal MD. Factors associated with unintended pregnancy in Brazil: cross-sectional results from the Birth in Brazil National Survey, 2011/2012. Reprod Health 2016; 13(Supl. 3):118.

10 Moreira LR, Ewerling F, Santos IS, Wehrmeister FC, Matijasevich A, Barros AJD, Menezes AMB, Gonçalves H, Murray J, Domingues MR, Silveira MF. Trends and inequalities in unplanned pregnancy in three population-based birth cohorts in Pelotas, Brazil. Int J Public Health 2020; 65(9):1635-1645.

11 Prietsch SO, González-Chica DA, Cesar JA, Mendoza-Sassi RA. Gravidez não planejada no extremo Sul do Brasil: prevalência e fatores associados. Cad Saude Publica 2011; 27(10):1906-1916.
-1212 Nilson TV, Amato AA, Resende CN, Primo WQSP, Nomura RMY, Costa ML, Opperman ML, Brock M, Trapani Junior A, Damasio LCVDC, Reis N, Borges V, Araújo AC, Ruano R, Zaconeta ACM. Unplanned pregnancy in Brazil: national study in eight university hospitals. Rev Saude Publica 2023; 57:35.. Destes estudos, o mais recente data de 2020 e incluiu somente um hospital em oito capitais brasileiras1212 Nilson TV, Amato AA, Resende CN, Primo WQSP, Nomura RMY, Costa ML, Opperman ML, Brock M, Trapani Junior A, Damasio LCVDC, Reis N, Borges V, Araújo AC, Ruano R, Zaconeta ACM. Unplanned pregnancy in Brazil: national study in eight university hospitals. Rev Saude Publica 2023; 57:35.. O único a considerar tendencia foi realizado em Pelotas-RS, encontrando taxa de não planejamento da gravidez de 62,7% em 1993, 65,9% em 2004 e 52,2% em 2015.11. Desde então, nenhum outro estudo avaliando tendencia sobre este tema no Brasil foi publicado.

Os Estudos Perinatais de Rio Grande, conduzidos a cada três anos desde 2007, coletaram diversas informações desde os seis meses antecedentes a gravidez até o pós-parto imediato. Dentre estas informações está a que trata do planejamento da gravidez. Foram cinco inquéritos censitários conduzidos ao longo de 13 anos1212 Nilson TV, Amato AA, Resende CN, Primo WQSP, Nomura RMY, Costa ML, Opperman ML, Brock M, Trapani Junior A, Damasio LCVDC, Reis N, Borges V, Araújo AC, Ruano R, Zaconeta ACM. Unplanned pregnancy in Brazil: national study in eight university hospitals. Rev Saude Publica 2023; 57:35..

O presente artigo tem por objetivo medir prevalência, avaliar tendência e identificar fatores associados ao não planejamento da gravidez em um município de porte médio no extremo sul do Brasil entre 2007 e 2019.

Métodos

O presente estudo foi conduzido em Rio Grande-RS, entre os anos de 2007 e 2019. Este município está localizado na faixa litorânea sul a cerca de 300 km de Porto Alegre e a 250 km da divisa com o Uruguai. Nesse período, sua população passou de 195 mil para 212 mil habitantes. Sua economia está alicerçada no comércio, agronegócio, principalmente na produção de arroz e pecuária extensiva, indústrias de fertilizantes, atividade pesqueira e movimentação portuária.

A rede pública de saúde pouco se modificou ao longo desses 13 anos, permanecendo com 36 unidades básicas de saúde, quatro centros de especialidades e dois hospitais gerais, sendo um deles com atendimento misto e o outro exclusivamente voltado ao Sistema Único de Saúde (SUS). O índice de desenvolvimento humano (IDH) alcançou 0,744, enquanto a mortalidade infantil passou de 9,3 para 11/1000 nascidos1313 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Rio Grande. Panorama [Internet]. 2010 [acessado 2022 mar 10]. Disponível em: https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rs/rio-grande/panorama.
https://cidades.ibge.gov.br/brasil/rs/ri...
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Os dados apresentados neste artigo fazem parte dos Estudos Perinatais de Rio Grande, que são inquéritos conduzidos em 2007, 2010, 2013, 2016 e 2019, cujo objetivo é monitorar a assistência oferecida à gestação e ao parto no município. O critério de inclusão foi ter tido filho entre 01/01 e 31/12 nesses anos e de este ter alcançado pelo menos 20 semanas de idade gestacional ou 500 g de peso ao nascer.

O delineamento é do tipo transversal, com as entrevistadas sendo abordadas uma única vez, em até 48 horas após o parto quando ainda no hospital. Além disso, é censitário por incluir todas as puérperas residentes tanto de área urbana quanto rural1414 Silva IS. Cancer epidemiology: principles and methods. Lyon: World Health Organization & International Agency for Research on Cancer; 1999..

Os dados foram coletados por meio de questionário único, padronizado, pré-codificado e dividido em blocos, que buscavam informações desde o planejamento da gravidez até o pós-parto imediato. Para este estudo, a maioria das perguntas e variáveis originaram-se dos blocos D, E e F. Esses blocos investigaram sobre saúde reprodutiva (número de gravidezes, abortos, filhos tidos vivos e/ou mortos, idade na primeira gravidez e primeiro parto); hábitos de vida e comportamento materno (tabagismo, consumo de álcool, café e chimarrão, realização de exercício físico) e características demográficas maternas e sociodemográficas da família (número de moradores no domicílio, grau de parentesco, idade, escolaridade, ocupação e renda individual no mês imediatamente anterior a entrevista). Maiores detalhes sobre a metodologia empregada nestes inquéritos podem ser obtidos em publicação específica1515 Cesar JA, Mendoza-Sassi RA, Marmitt LP. Evolução da assistência à gestação e ao parto no extremo sul do Brasil. Rev Saude Publica 2021; 55:50..

A aplicação dos questionários foi realizada por quatro entrevistadoras treinadas durante 40 horas, as quais passaram por estudo piloto no mês imediatamente anterior ao início da coleta de dados. Diariamente, elas visitavam a maternidade e todas as enfermarias de cada um dos hospitais em busca de nascimentos cujas mães residissem no município de Rio Grande. Ao encontrar alguma puérpera, a entrevistadora explicava o estudo, convidava-a a participar e, em aceitando, assinava duas vias do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Uma via era entregue à mãe, enquanto a outra era arquivada na sede do projeto na Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Somente após essa etapa, a entrevista era iniciada.

Os inquéritos de 2007, 2010 e 2013 foram feitos a partir de questionários físicos, nos quais as entrevistadoras codificavam e revisavam as questões fechadas ao final de cada dia de trabalho. No dia seguinte, os questionários eram entregues na sede do projeto, quando eram revisados, duplamente digitados por diferentes professionais e na ordem inversa à primeira. A cada bloco de 100 questionários as digitações eram comparadas e, se necessário, corrigidas. Todas estas etapas foram realizadas utilizando-se os softwares livres Epi Data1616 Lauritsen JM, editor. EpiData Data Entry, Data Management and basic Statistical Analysis System. Odense [Internet]. Denmark: EpiData Association; 2000-2008 [cited 2022 mar 10]. Available from: http://www.epidata.dk. e Epi Info1717 Dean AG, Arner T, Sunki G, Friedman R, Lantinga M, Sangam S, et al. Epi InfoTM, a database and statistics program for public health professionals. Atlanta: CDC; 2011..

Nos inquéritos de 2016 e 2019, a entrada de dados se deu de forma simultânea à entrevista por meio de tablets e do aplicativo REDCap (Research Electronic Data Capture)1818 Harris PA, Taylor R, Thielke R, Payne J, Gonzalez N, Conde JG. Research electronic data capture (REDCap) - A metadata-driven methodology and workflow process for providing translational research informatics support. J Biomed Inform 2009; 42(2):377-381.. Ao final de cada dia, estes questionários eram descarregados no servidor da FURG e em seguida revisados.

O desfecho deste estudo foi definido com base na resposta negativa à seguinte pergunta: “A Sra. planejou ter esse filho ou engravidou sem querer?”. Todas as puérperas que responderam “não ter planejado” ou “ter engravidado sem querer” foram consideradas como gravidez não planejada, constituindo assim o desfecho deste estudo.

A análise inicial consistiu na listagem de frequência das variáveis de interesse. Em seguida, foi realizada análise bivariada para verificar a distribuição do desfecho em relação a diferentes exposições, esta avaliada pelo teste qui-quadrado de Pearson. Posteriormente, foi realizada análise multivariável por meio da Regressão de Poisson com ajuste da variância robusta1919 Kirkwood BR, Sterne JAC. Essentials of medical statistics. 2ª ed. London: Blackwell Science Ltd; 2003.,2020 Barros AJ, Hirakata VN. Alternatives for logistic regression in cross-sectional studies: an empirical comparison of models that directly estimate the prevalence ratio. BMC Med Res Methodol 2003; 3:21.. Esta última etapa obedeceu a modelo hierárquico previamente definido com as variáveis independentes alocadas em três níveis: distal (demográficas e socioeconômicas); intermediário (reprodutivas e de assistência à gestação) e proximal (comportamentais e hábitos de vida). As variáveis situadas em nível hierarquicamente superior ao da variável em questão foram consideradas como potenciais confundidores na relação com o desfecho, no caso, o não planejamento da gravidez (Quadro 1). Para ser mantida no modelo na análise ajustada, o p-valor na associação com o desfecho deveria ser ≤0,202121 Victora CG, Huttly SR, Fuchs SC, Olinto MT. The role of conceptual frameworks in epidemiological analysis: a hierarchical approach. Int J Epidemiol 1997; 26(1):224-227.. A medida de efeito utilizada foi a razão de prevalências para um intervalo de confiança de 95% (IC95%). Os testes de Wald de heterogeneidade e de tendência linear foram empregados para exposições ordinais1919 Kirkwood BR, Sterne JAC. Essentials of medical statistics. 2ª ed. London: Blackwell Science Ltd; 2003.. Todas estas análises foram realizadas utilizando-se do pacote estatístico Stata 11.02222 StataCorp. Stata Statistical Software: release 11.2. College Station: StataCorp LP; 2011..

Quadro 1
Modelo hierárquico de análise para não planejamento da gravidez entre puérperas. Rio Grande-RS, 2007-2019.

Com objetivo de avaliar a concordância das respostas fornecidas pelas mães logo após o nascimento, cerca de 10% das entrevistas foram parcialmente repetidas em até 15 dias após a entrevista inicial. O índice Kappa de concordância variou de 0,61 a 0,99, sendo que a maioria ficou entre 0,72 e 0,91, nível considerado satisfatório2323 Gordis L. Epidemioloy. 4ª ed. Philadelphia: Elsevier Saunders; 2009..

Todos os protocolos de pesquisas foram aprovados pelo Comitê de Ética em Pesquisa na Área da Saúde (CEPAS) da FURG, sob os seguintes números: inquérito de 2007 (parecer 05369/2006); 2010 (parecer 06258/2009); 2013 (parecer 02623/2012); 2016 (parecer 0030-2015) e 2019 (parecer 278/2018).

Resultados

Nos cinco inquéritos realizados no município de Rio Grande foram identificadas 12.663 puérperas. Destas, foi possível entrevistar com sucesso 12.415, o que representa taxa de resposta de 98%.

A Tabela 1 mostra a distribuição proporcional das puérperas que não planejaram a gravidez conforme as principais variáveis estudadas. Houve aumento na proporção dessa condição entre puérperas de menor idade (≤19 anos), menor escolaridade (≤8 anos) e pertencentes ao 1º e 2º quartil de renda familiar. Além disso, houve aumento na proporção entre aquelas com maior número de moradores no domicílio, maior paridade e tabagistas. A penúltima coluna à direita dessa mesma tabela mostra a variação ocorrida entre os extremos (2007 e 2019). O maior aumento percentual para o não planejamento se deu entre mães residentes em domicílios com até dois ocupantes, alcançado 23,2%, enquanto a menor redução ocorreu entre aquelas com 12 anos ou mais de escolaridade, chegando a 8,1%. Na última coluna é apresentado o teste de tendência linear. Dentre todas as categorias das variáveis incluídas nesta tabela apenas uma delas (idade entre 20 e 29 anos) não apresentou significância estatística (ptend=0,163). A prevalência geral de gravidez não planejada no período foi de 63,3% (IC95%: 62,5%-64,1%).

Tabela 1
Distribuição das puérperas para algumas de suas características conforme o não planejamento da gravidez. Rio Grande-RS, 2007-2019.

Na Tabela 2, é possível verificar que, dentre todas as variáveis apresentadas no Quadro 1, somente as variáveis “companheiro desempregado” e “ocorrência prévia de aborto” perderam a significância estatística após controle para fatores de confusão. Todas as demais variáveis exerceram efeito independente sobre a ocorrência do desfecho. Assim, puérperas com idade entre 11 e 19, cor da pele preta, que viviam com companheiro, com até 8 anos de escolaridade, e pertencentes ao pior quartil de renda mostraram maior RP ao não planejamento familiar em comparação àquelas com 30 anos ou mais de idade, pele branca, vivendo com companheiro, com 12+ anos de escolaridade e pertencentes ao melhor quartil de renda, respectivamente. Puérperas que não exerceram trabalho remunerado na gravidez, que tiveram 2+ filhos e que fumaram antes e/ou durante a gravidez mostraram maior RP em relação as demais ao não planejamento da gravidez. Por fim, quanto maior o número de moradores no domicílio, maior a RP para o não planejamento com nítido efeito dose-resposta.

Tabela 2
Análises bruta e ajustada para fatores associados ao não planejamento da gravidez no município de Rio Grande-RS, 2007-2019.

Discussão

Praticamente duas em cada três rio-grandinas não planejaram a gravidez, tendo esta taxa sido elevada ao final do período, sobretudo entre aquelas de maior risco à ocorrência de eventos desfavoráveis durante a gestação e o parto. A análise ajustada mostrou que puérperas de menor idade, cor da pele preta, vivendo sem companheiro, com maior aglomeração domiciliar, menor escolaridade e renda familiar, maior paridade e tabagistas, apresentaram as maiores RP ao não planejamento da gravidez.

A prevalência média de 63,3% de não planejamento observada nesses inquéritos é semelhante àquela observada no baseline da coorte de Pelotas de 1993 (62,7%), ligeiramente inferior à de 2004 (65,9%), mas superior a taxa encontrada em 2015 (52,2%)1010 Moreira LR, Ewerling F, Santos IS, Wehrmeister FC, Matijasevich A, Barros AJD, Menezes AMB, Gonçalves H, Murray J, Domingues MR, Silveira MF. Trends and inequalities in unplanned pregnancy in three population-based birth cohorts in Pelotas, Brazil. Int J Public Health 2020; 65(9):1635-1645.. Em São Luís-MA, essa prevalência alcançou 68,1%, em 20102424 Costa ACM, Oliveira BLCA, Alves MTSS. Prevalence and factors associated with unplanned pregnancy in a Brazilian capital in the Northeast. Rev Bras Saude Materno Infantil 2021; 21(2):461-471., enquanto em Ribeirão Preto-SP, foi de 53,8%2525 Vieira CS, Braga GC, Lugarinho PTC, Stifani BM, Bettiol H, Barbieri MA, Cardoso VC, Cavalli RC. Sociodemographic factors and prenatal care behaviors associated with unplanned pregnancy in a Brazilian birth cohort study. Int J Gynecol Obstetr 2020; 151(2):237-243.. No Brasil como um todo, em estudo de base hospitalar conduzido entre 2011-12 encontrou prevalência de não planejamento da gravidez de 55,4%99 Theme-Filha MM, Baldisserotto ML, Fraga AC, Ayers S, Gama SG, Leal MD. Factors associated with unintended pregnancy in Brazil: cross-sectional results from the Birth in Brazil National Survey, 2011/2012. Reprod Health 2016; 13(Supl. 3):118., enquanto inquérito feito em 2020 em oito hospitais universitários identificou 67,5%1212 Nilson TV, Amato AA, Resende CN, Primo WQSP, Nomura RMY, Costa ML, Opperman ML, Brock M, Trapani Junior A, Damasio LCVDC, Reis N, Borges V, Araújo AC, Ruano R, Zaconeta ACM. Unplanned pregnancy in Brazil: national study in eight university hospitals. Rev Saude Publica 2023; 57:35.. Esta elevada ocorrência em diferentes localidades indica tratar-se de um problema que requer ações em diferentes níveis de gestão do serviço público. Além do setor saúde, o de educação também deveria ser incluído, visto que boa parte delas cursam ainda o ensino médio.

Quanto menor a idade, maior a proporção de parturientes que não planejaram a gravidez em Rio Grande. Esse padrão foi também identificado em outros estudos e pode ser atribuído à falta de conhecimento sobre métodos efetivos de prevenir a gravidez, falta de maturidade, dificuldade de acesso a métodos contraceptivos seguros e/ou preocupação quanto a efeitos colaterais do seu uso, descuido e/ou desinteresse99 Theme-Filha MM, Baldisserotto ML, Fraga AC, Ayers S, Gama SG, Leal MD. Factors associated with unintended pregnancy in Brazil: cross-sectional results from the Birth in Brazil National Survey, 2011/2012. Reprod Health 2016; 13(Supl. 3):118.

10 Moreira LR, Ewerling F, Santos IS, Wehrmeister FC, Matijasevich A, Barros AJD, Menezes AMB, Gonçalves H, Murray J, Domingues MR, Silveira MF. Trends and inequalities in unplanned pregnancy in three population-based birth cohorts in Pelotas, Brazil. Int J Public Health 2020; 65(9):1635-1645.

11 Prietsch SO, González-Chica DA, Cesar JA, Mendoza-Sassi RA. Gravidez não planejada no extremo Sul do Brasil: prevalência e fatores associados. Cad Saude Publica 2011; 27(10):1906-1916.
-1212 Nilson TV, Amato AA, Resende CN, Primo WQSP, Nomura RMY, Costa ML, Opperman ML, Brock M, Trapani Junior A, Damasio LCVDC, Reis N, Borges V, Araújo AC, Ruano R, Zaconeta ACM. Unplanned pregnancy in Brazil: national study in eight university hospitals. Rev Saude Publica 2023; 57:35.,1515 Cesar JA, Mendoza-Sassi RA, Marmitt LP. Evolução da assistência à gestação e ao parto no extremo sul do Brasil. Rev Saude Publica 2021; 55:50.,2424 Costa ACM, Oliveira BLCA, Alves MTSS. Prevalence and factors associated with unplanned pregnancy in a Brazilian capital in the Northeast. Rev Bras Saude Materno Infantil 2021; 21(2):461-471.

25 Vieira CS, Braga GC, Lugarinho PTC, Stifani BM, Bettiol H, Barbieri MA, Cardoso VC, Cavalli RC. Sociodemographic factors and prenatal care behaviors associated with unplanned pregnancy in a Brazilian birth cohort study. Int J Gynecol Obstetr 2020; 151(2):237-243.

26 Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA). Relatório sobre a Situação da População Mundial 2022. Vendo o invisível: Em defesa da ação na negligenciada crise da gravidez não intencional [Internet]. UNFPA Brasil; 2022 [acessado 2023 jan 15]. Disponível em: https://brazil.unfpa.org/pt-br/publications/situacao-da-populacao-mundial-2022.
https://brazil.unfpa.org/pt-br/publicati...
-2727 Ameyaw EK, Budu E, Sambah F, Baatiema L, Appiah F, Seidu AA, Ahinkorah BO. Prevalence and determinants of unintended pregnancy in sub-Saharan Africa: A multi-country analysis of demographic and health surveys. PloS One 2019; 14(8):e0220970..

Mães de cor da pele preta também mostraram maior RP ao não planejamento da gravidez confirmando achado similar em outros estudos99 Theme-Filha MM, Baldisserotto ML, Fraga AC, Ayers S, Gama SG, Leal MD. Factors associated with unintended pregnancy in Brazil: cross-sectional results from the Birth in Brazil National Survey, 2011/2012. Reprod Health 2016; 13(Supl. 3):118.,1515 Cesar JA, Mendoza-Sassi RA, Marmitt LP. Evolução da assistência à gestação e ao parto no extremo sul do Brasil. Rev Saude Publica 2021; 55:50.,2424 Costa ACM, Oliveira BLCA, Alves MTSS. Prevalence and factors associated with unplanned pregnancy in a Brazilian capital in the Northeast. Rev Bras Saude Materno Infantil 2021; 21(2):461-471.,2828 Pacheco VC, Silva JC, Mariussi AP, Lima MR, Silva TR. As influências da raça/cor nos desfechos obstétricos e neonatais desfavoráveis. Saude Debate 2018; 42(116):125-137.,2929 Victora CG, Matijasevich A, Silveira MF, Santos IS, Barros AJD, Barros FC. Socio-economic and ethnic group inequities in antenatal care quality in the public and private sector in Brazil. Health Policy Plan 2010; 25(4):253-261.. Além dos fatores já citados, mães de cor da pele preta tem maiores dificuldades no acesso aos serviços de saúde que, muitas vezes, se mostram insuficientes em termos de quantidade e inadequados quanto à qualidade2828 Pacheco VC, Silva JC, Mariussi AP, Lima MR, Silva TR. As influências da raça/cor nos desfechos obstétricos e neonatais desfavoráveis. Saude Debate 2018; 42(116):125-137.

29 Victora CG, Matijasevich A, Silveira MF, Santos IS, Barros AJD, Barros FC. Socio-economic and ethnic group inequities in antenatal care quality in the public and private sector in Brazil. Health Policy Plan 2010; 25(4):253-261.

30 Macinko J, Mullachery P, Proietti FA, Lima-Costa MF. Who experiences discrimination in Brazil? Evidence from a large metropolitan region. Int J Equity Health 2012; 11:80.
-3131 Victora CG, Barreto ML, Leal MC, Monteiro CA, Schmidt MI, Paim J, Bastos FI, Almeida C, Bahia L, Travassos C, Reichenheim M. The Lancet Brazil Series Working Group. Health conditions and health-policy innovations in Brazil: the way forward. Lancet 2011; 377(9782):2042-2053.. Isto indica discriminação estrutural, ou seja, faz parte da organização social brasileira, possui múltiplos determinantes, não é recente e nem facilmente percetível pelo usuário. No entanto, exigirá esforços da sociedade civil e, sobretudo do governo, por meio de políticas e programas2828 Pacheco VC, Silva JC, Mariussi AP, Lima MR, Silva TR. As influências da raça/cor nos desfechos obstétricos e neonatais desfavoráveis. Saude Debate 2018; 42(116):125-137.,3030 Macinko J, Mullachery P, Proietti FA, Lima-Costa MF. Who experiences discrimination in Brazil? Evidence from a large metropolitan region. Int J Equity Health 2012; 11:80.,3131 Victora CG, Barreto ML, Leal MC, Monteiro CA, Schmidt MI, Paim J, Bastos FI, Almeida C, Bahia L, Travassos C, Reichenheim M. The Lancet Brazil Series Working Group. Health conditions and health-policy innovations in Brazil: the way forward. Lancet 2011; 377(9782):2042-2053..

Quanto menor a escolaridade e pior a renda, maior a RP ao não planejamento da gravidez. Nenhum fator isolado tem tantos benefícios à saúde materno-infantil como escolaridade2626 Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA). Relatório sobre a Situação da População Mundial 2022. Vendo o invisível: Em defesa da ação na negligenciada crise da gravidez não intencional [Internet]. UNFPA Brasil; 2022 [acessado 2023 jan 15]. Disponível em: https://brazil.unfpa.org/pt-br/publications/situacao-da-populacao-mundial-2022.
https://brazil.unfpa.org/pt-br/publicati...
. Ao melhorar a escolaridade, as mulheres passam a ter acesso a informações essenciais para cuidar de sua saúde e a de seus filhos, adquirem habilidades argumentativas, conhecem melhor seus direitos e passam a participar de forma mais efetiva da vida social, incluindo ocupação de postos no mercado de trabalho44 Ticona DM, Huanco D, Ticona-Rendón MB. Impact of unplanned pregnancy on neonatal outcomes: findings of new high-risk newborns in Peru. Int Health 2024; 16(1):52-60.,2727 Ameyaw EK, Budu E, Sambah F, Baatiema L, Appiah F, Seidu AA, Ahinkorah BO. Prevalence and determinants of unintended pregnancy in sub-Saharan Africa: A multi-country analysis of demographic and health surveys. PloS One 2019; 14(8):e0220970.. Ao fazer isso, aumentam a renda familiar, melhoram o poder de compra, sua condição de vida e a da sua família. Estes avanços, sem dúvida, contribuem para um melhor planejamento de suas vidas, o que inclui a escolha do momento mais apropriado para se tornar mãe2727 Ameyaw EK, Budu E, Sambah F, Baatiema L, Appiah F, Seidu AA, Ahinkorah BO. Prevalence and determinants of unintended pregnancy in sub-Saharan Africa: A multi-country analysis of demographic and health surveys. PloS One 2019; 14(8):e0220970.,3131 Victora CG, Barreto ML, Leal MC, Monteiro CA, Schmidt MI, Paim J, Bastos FI, Almeida C, Bahia L, Travassos C, Reichenheim M. The Lancet Brazil Series Working Group. Health conditions and health-policy innovations in Brazil: the way forward. Lancet 2011; 377(9782):2042-2053.. Isso ajuda explicar a maior RP observada ao não planejamento da gravidez entre aquelas com pior nível socioeconômico em comparação as demais.

Não possuir companheiro mostrou-se um fator de risco para a gravidez não planejada. Relacionamentos instáveis, ainda que com o mesmo parceiro, dificultam o uso continuado de métodos contraceptivos, o que aumenta a exposição à gravidez55 Carlander A, Hultstrand JN, Reuterwall I, Jonsson M, Tydén T, Kullinger M. Unplanned pregnancy and the association with maternal health and pregnancy outcomes: A Swedish cohort study. PLoS One 2023; 18(5):e0286052.,2424 Costa ACM, Oliveira BLCA, Alves MTSS. Prevalence and factors associated with unplanned pregnancy in a Brazilian capital in the Northeast. Rev Bras Saude Materno Infantil 2021; 21(2):461-471.. Em Ribeirão Preto-SP, a razão de chances para o não planejamento da gravidez entre mulheres sem companheiro foi 7,56 (IC95%: 5,98%-9,56%) vezes maior em relação às demais2525 Vieira CS, Braga GC, Lugarinho PTC, Stifani BM, Bettiol H, Barbieri MA, Cardoso VC, Cavalli RC. Sociodemographic factors and prenatal care behaviors associated with unplanned pregnancy in a Brazilian birth cohort study. Int J Gynecol Obstetr 2020; 151(2):237-243.. Nos inquéritos perinatais de Rio Grande, a presença de companheiro tem mostrado efeito benéfico e independente sobre diferentes desfechos1111 Prietsch SO, González-Chica DA, Cesar JA, Mendoza-Sassi RA. Gravidez não planejada no extremo Sul do Brasil: prevalência e fatores associados. Cad Saude Publica 2011; 27(10):1906-1916.,1515 Cesar JA, Mendoza-Sassi RA, Marmitt LP. Evolução da assistência à gestação e ao parto no extremo sul do Brasil. Rev Saude Publica 2021; 55:50.. Esta análise reforça a importância do companheiro, na grande maioria das vezes o próprio pai biológico, como um fator de proteção à saúde materno-infantil.

A medida que aumenta o número de moradores no domicílio, também eleva a possibilidade de não planejamento da gravidez. O efeito dose-resposta foi muito evidente, mais até que os valores observados para outras variáveis, como renda familiar e escolaridade materna, por exemplo. Em ambientes com número elevado de pessoas, as mulheres, por serem responsáveis pela maior parte dos afazeres domésticos, muitas vezes, negligenciam os cuidados em relação à sua própria saúde2727 Ameyaw EK, Budu E, Sambah F, Baatiema L, Appiah F, Seidu AA, Ahinkorah BO. Prevalence and determinants of unintended pregnancy in sub-Saharan Africa: A multi-country analysis of demographic and health surveys. PloS One 2019; 14(8):e0220970.. É possível que isto leve ao uso irregular de métodos contraceptivos, sobretudo quando de uso diário, como anticoncepcional oral, amplamente utilizado2323 Gordis L. Epidemioloy. 4ª ed. Philadelphia: Elsevier Saunders; 2009.. O uso incorreto dos contraceptivos pode resultar em falhas na prevenção da gravidez levando à gravidez não planejada99 Theme-Filha MM, Baldisserotto ML, Fraga AC, Ayers S, Gama SG, Leal MD. Factors associated with unintended pregnancy in Brazil: cross-sectional results from the Birth in Brazil National Survey, 2011/2012. Reprod Health 2016; 13(Supl. 3):118.,1111 Prietsch SO, González-Chica DA, Cesar JA, Mendoza-Sassi RA. Gravidez não planejada no extremo Sul do Brasil: prevalência e fatores associados. Cad Saude Publica 2011; 27(10):1906-1916.,2424 Costa ACM, Oliveira BLCA, Alves MTSS. Prevalence and factors associated with unplanned pregnancy in a Brazilian capital in the Northeast. Rev Bras Saude Materno Infantil 2021; 21(2):461-471.

25 Vieira CS, Braga GC, Lugarinho PTC, Stifani BM, Bettiol H, Barbieri MA, Cardoso VC, Cavalli RC. Sociodemographic factors and prenatal care behaviors associated with unplanned pregnancy in a Brazilian birth cohort study. Int J Gynecol Obstetr 2020; 151(2):237-243.
-2626 Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA). Relatório sobre a Situação da População Mundial 2022. Vendo o invisível: Em defesa da ação na negligenciada crise da gravidez não intencional [Internet]. UNFPA Brasil; 2022 [acessado 2023 jan 15]. Disponível em: https://brazil.unfpa.org/pt-br/publications/situacao-da-populacao-mundial-2022.
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O tabagismo mostrou-se fator de risco independente ao não planejamento da gravidez. O Estudo Nascer no Brasil também identificou razão de chances de 1,23 (IC95%: 1,06%-1,43%) para o não planejamento da gravidez entre puérperas fumantes99 Theme-Filha MM, Baldisserotto ML, Fraga AC, Ayers S, Gama SG, Leal MD. Factors associated with unintended pregnancy in Brazil: cross-sectional results from the Birth in Brazil National Survey, 2011/2012. Reprod Health 2016; 13(Supl. 3):118.. Poucos estudos mostraram esta associação. Considerando que é amplamente conhecido que o cigarro é prejudicial à saúde tanto da mãe quanto do feto e mesmo assim algumas mulheres continuam fumando, a falta de planejamento familiar pode indicar despreocupação com a sua própria saúde. Seria interessante avaliar esse achado em outros estudos. De qualquer modo, em Rio Grande, o tabagismo apareceu como um determinante independente do não planejamento da gravidez, e isso precisa ser considerado pelas equipes de saúde.

Ao interpretar esses resultados há que considerar que os dados foram coletados em um período de 13 anos, durante o qual ocorreram mudanças importantes no cenário econômico local. Desde o pleno emprego impulsionado pela atividade de construção naval de plataformas de petróleo até as altas taxas de desemprego após a desativação dos estaleiros. Esses fatores certamente tiveram impacto nos resultados apresentados, pelo menos até 2013. No entanto, essas mudanças não parecem ser suficientes para alterar a direção ou eliminar os resultados encontrados. É importante destacar que este trabalho é o que possui o menor intervalo entre coleta de dados, já realizado no Brasil e incluiu todas as puérperas de um município de porte médio com taxa de respostas de pelo menos 96% nos cinco inquéritos, achado raro no Brasil.

Esse estudo apresentou elevada prevalência de gravidez não planejada principalmente entre àquelas com maior risco de ocorrências desfavoráveis na gravidez e no parto. Verificou-se evidente sobrecarga entre as mais vulneráveis, o que eleva ainda mais o risco de morbimortalidade nesse grupo. A fim de evitar a ocorrência de gravidez não planejada, seria oportuno alcançar estas mulheres por meio de campanhas de conscientização e da disponibilização de métodos contraceptivos seguros, reversíveis e com orientação adequada por parte dos serviços públicos de saúde. Isto, por certo, traria inúmeros benefícios à saúde materno-infantil no município de Rio Grande.

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  • Financiamento

    Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico: 305754/2015-7 e 309570/2019-0. Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior: 88881.337054/2019-1. Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul: 0700090 e 19/2551-0001732-4.

Editores-chefes:

Romeu Gomes, Antônio Augusto Moura da Silva

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Maio 2024
  • Data do Fascículo
    Maio 2024

Histórico

  • Recebido
    24 Jul 2023
  • Aceito
    01 Set 2023
  • Publicado
    03 Set 2023
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