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Paulo Prado e o conceito de progresso

Paulo Prado and the concept of progress

Resumo

No interior da formatação da experiência moderna criou-se uma violenta ideologia civilizatória eurocêntrica com propósitos universalizantes, ainda que, segundo Elias Palti e Julio Ramos, ela seja resultado da interação e circulação de ideias entre diversas culturas. Das muitas categorias e conceitos importantes nestes processos, o progresso se tornou uma das mais centrais. Abordaremos algumas possibilidades desta categoria através da obra de Koselleck e, em seguida, como ela foi mobilizada por Paulo Prado no início do século XX. Nossa hipótese é a de que Prado entende que a realização de progressos depende de articulações adequadas com o passado colonial brasileiro.

Palavras-chave:
Progresso; Escrita da História; História intelectual

Abstract

Within the formatting of the modern experience, a violent eurocentric civilizing ideology with universalizing purposes was created, even though it is the result of the interaction and circulation of ideas between different cultures, as Elias Palti e Julio Ramos said. Of the varials important categories and concepts in these processes, progress has become one of the most central. We will approach some possibilities of this category through the work of Koselleck and, afterwards, how it was mobilized by Paulo Prado in the beginning of the 20th century. Our hypothesis is that Prado understands that making progress depends on adequate articulations with the Brazilian colonial past.

Keywords:
Progress; History Writing; Intellectual History

Algumas possibilidades sobre o surgimento do conceito de progresso

Para abordarmos a importância da ideia de progresso e como ela se entrelaça a tematização e representação do passado em Retrato do Brasil (1928) de Paulo Prado (1869-1943), é de grande relevância que façamos algumas considerações por meio do surgimento da noção de progresso e sua sedimentação no século XVIII e XIX. Com isto, é possível notar algumas das condições semânticas deste conceito e suas particularidades no que diz respeito ao ensaio de Prado. Após este primeiro momento, será possível relacionar melhor como a perspectiva de progresso apresentada por Prado se conecta com sua escrita da história que quer instigar sujeitos à ação.

Ao discorrer acerca do conceito moderno de progresso trabalhado por Koselleck, não quero dizer que esta possibilidade surgiu no contexto europeu e foi depois “importada” para a América Latina. Aponto para a compreensão a respeito da circularidade de ideias entre os mais diferentes espaços, para o surgimento e transformações de categorias e conceitos modernos onde os latino-americanos são extremamente relevantes. É com isto em mente que pretendo assinalar as singularidades acerca da escrita da história no ensaio de Prado.

Segundo Koselleck, não é conhecida, até o século XVIII, uma experiência semântica a qual determinasse um conceito próprio a todas as histórias de grupos e sociedades específicas ( KOSELLECK, 2006KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: Contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto; Editora PUC/RJ, 2006., p. 121). A experiência de um “tempo novo”, inédito, trouxe à modernidade a noção de que o futuro seria cada vez mais desafiador. O mundo moderno, determinado tecnicamente e industrialmente, passou a produzir novas experiências antes mesmo que fosse possível se adaptar às anteriores. Em um encaminhamento acelerado para o futuro agora desconhecido, o “horizonte de expectativas” parece afligir seus contemporâneos ( KOSELLECK, 2006KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: Contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto; Editora PUC/RJ, 2006.).

Neste tempo vivenciado por meio de ineditismo constante, as metanarrativas, que são “mecanismos e formas de elaboração da experiência”, apenas puderam surgir com o estabelecimento do novo conceito de história como um singular coletivo ( KOSELLECK, 2006KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: Contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto; Editora PUC/RJ, 2006., p. 16). Isto porque as filosofias da história unificam as experiências de todos os grupos e sociedades em um percurso e sentido comum, como a ideia de progresso linear, a luta de classes, etc. ( KOSELLECK, 2006KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: Contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto; Editora PUC/RJ, 2006., p. 16). Portanto, a história como um singular coletivo seria a condição semântica para emergir a possibilidade da busca por um télos no interior das experiências passadas que se diferenciam do presente em direção ao futuro (filosofias da história). Ou melhor, “com o surgimento do conceito ‘história absoluta’ [ geschichte schlechthin] abriu-se espaço para a filosofia da história, na qual o significado transcendental de história é contaminado pela noção de história como consciência e como espaço de ação” ( KOSELLECK, 2006KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: Contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto; Editora PUC/RJ, 2006., p. 119).

A experiência e a perspectiva de que o passado e o futuro se diferenciam qualitativamente de forma acelerada, provocou o aparecimento e a generalização da noção de progresso, “assim, o progresso descortina um futuro capaz de ultrapassar o espaço do tempo e da experiência tradicional, natural e prognosticável, o qual, por força de sua dinâmica, provoca por sua vez novos prognósticos, transnaturais e de longo prazo” ( KOSELLECK, 2006KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: Contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto; Editora PUC/RJ, 2006., p. 36). Para Gumbrecht, a concepção moderna de progresso tornou-se disponível com o surgimento do “observador de primeira ordem”, onde parte significativa dos sujeitos passaram a compreenderem uma separação entre sujeito (quem observa, sente, investiga e compreende a realidade) e objetos. Ou melhor, os sujeitos deixaram de incluir-se entre os objetos (coisas) do mundo. A partir disto, tudo aquilo que compõe a natureza, passa a ser compreendido como recursos a serem transformados pela técnica e tecnologia em favor do progresso humano cada vez mais intenso com o passar do tempo ( GUMBRECHT, 1998GUMBRECHT, Hans Ulrich. Cascatas de modernidade; Espaços de tempo pós-modernos. In:GUMBRECHT, Hans Ulrich. Modernização dos Sentidos. São Paulo: Editora 34, 1998., p. 12-14).

Koselleck explicita que a noção de progresso reduz drasticamente o que chama de “espaço de experiência”, ou seja, suprime tradições que vigoravam até então. O passado se torna distante do futuro, e o presente se apresenta de forma curta e acelerada, já que o “horizonte de expectativas” se amplia. No entanto, na contramão da perspectiva do progresso, esta erosão das tradições, do passado ou “espaço de experiências”, muitas vezes também é entendida como “degeneração” ou “decadência”. Deste modo, o processo de transformação não é sempre percebido na modernidade como mudança qualitativa.

Mesmo assim, o progresso se torna um agente de transformação que atribui sentido para mudanças históricas, portanto, uma filosofia da história, que se move no tempo a despeito das ações humanas, ou seja, é um “sujeito transpersonal da ação”. Mesmo que possa ser atrasado ou acelerado pelos sujeitos, o progresso é entendido na experiência moderna como algo que se realiza inevitavelmente. 1 1 A perspectiva temporal acelerada que se relaciona com as transformações das realidades e o progresso como “sujeito transpersonal da ação” se encontram tanto no plano da linguagem cotidiana como na linguagem política científica. No entanto, as consequências desastrosas dos processos civilizatórios vão, aos poucos, tornando possível certa desconfiança acerca do progresso, incerteza que é uma marca no trabalho de Prado. Como Koselleck afirma:

mas por trás da denominação “progresso”, que se refere a um processo técnico e social, que devido suas consequências é utilizado com um progressivo ceticismo, há um problema da nossa linguagem, linguagem que se ocupa das modificações e processos políticos, sociais e históricos ( KOSELLECK, 2012KOSELLECK, Reinhart. Historias de conceptos: estúdios sobre semantica y pragmática del linguaje. Madrid: Editorial Trotta, 2012., p. 97, tradução nossa).

Por meio da linguagem, as experiências expressam-se em conceitos. Segundo Koselleck, estas expressões que tematizam a vida cotidiana necessitam de uma base espacial e o seu uso precisa ser naturalizado no cotidiano:

[...] “movimento” implica o caminho que será deixado para trás; “progresso”, ir progressivamente daqui para li; “degeneração” e “decadência” é utilizado para se referir ao que se decorreu para baixo, assim como o processo de debilitação de um corpo vivo; também “revolução” possuía inicialmente um significado espacial, a orbita circular das estrelas, antes de que se aplicasse a processos sociais e políticos ( KOSELLECK, 2012KOSELLECK, Reinhart. Historias de conceptos: estúdios sobre semantica y pragmática del linguaje. Madrid: Editorial Trotta, 2012., p. 97, tradução nossa).

Estas noções espaciais são tomadas emprestadas para descrever diversos fenômenos históricos, atribuindo aos conceitos a qualidade de metáforas. Para Koselleck, a noção de progresso se tornou um conceito genuíno no início do século XIX, ao deixar em segundo plano sua perspectiva de movimento espacial para se tornar uma ideia naturalizada de transformação rumo à melhora da humanidade. De forma diferente, para Koselleck, “decadência” e “degeneração” não fizeram este movimento e não se tornaram “conceitos genuínos”.

A ideia, desde o aufklärun (iluminismo), de que a Idade Média foi uma pausa obscura e que a Antiguidade era um modelo a ser emulado, intensificou a noção de progresso compreendido como algo que aponta para um futuro “melhor”. Neste processo, o conhecimento da natureza substituiu aos poucos a autoridade dos antigos, e isto por meio do uso autônomo da razão e da interpretação da história, do futuro como progresso, um mundo no qual o descobrimento e o domínio da natureza aumentariam a partir da constituição de metodologias elaboradas ( KOSELLECK, 2012KOSELLECK, Reinhart. Historias de conceptos: estúdios sobre semantica y pragmática del linguaje. Madrid: Editorial Trotta, 2012., p. 101-102). Estevão Martins ressalta que, durante o século XIX firmou-se, especialmente no interior do pensamento histórico, a ideia de que o método deveria se tornar cada vez mais científico, através das fontes, da obtenção de dados testáveis, de modo que pudessem constituir generalizações como interpretações e metanarrativas ( MARTINS, 2008MARTINS, Estevão C. de Rezende. Historicismo: útil e o agradável. In: VARELLA, Flávia Florentino; MOLLO, Helena Miranda; MATA, Sérgio Ricardo da; ARAUJO, Valdei Lopes de. A dinâmica do historicismo: revisitando a historiografia moderna. Belo Horizonte: Argumentum, 2008., p. 39-40). 2 2 Segundo Martins, essas perspectivas estão associadas ao historicismo, as quais foram, por diversas vezes, confundidas com o positivismo. Este, em uma de suas muitas versões, sacralizou as fontes e os dados obtidos, gerando uma expectativa exacerbada quanto ao objetivismo. No interior destes problemas, a historicização foi entendida, também, como a ideia de que cada experiência histórica é tão restrita e específica que não poderia ser minimamente compreendida ou representada a partir de outra historicidade.

Após o século XVII, retrocesso e decadência não são mais processos opostos ao avanço do progresso, pois ele passa a ser entendido como um processo imparável. O retrocesso ou é passageiro ou estímulo para o próprio progresso.

A dizer, não só o homem, senão também o mundo melhora constantemente, e quando se retrocede, é para avançar depois com o dobro da velocidade e o dobro da distância; Em uma frase: “o mundo é o melhor de todos os mundos somente porque melhora constantemente” ( KOSELLECK, 2012KOSELLECK, Reinhart. Historias de conceptos: estúdios sobre semantica y pragmática del linguaje. Madrid: Editorial Trotta, 2012., p. 104).

No XVIII, a ideia de “perfeição” se tornou um fim a ser imitado: descobrir as leis da natureza e dirigir-se ao percurso que permite dominá-la, o que também foi instituído na moral e ética. A perfeição enquanto constante melhora foi então temporalizada e substituída de um fim a um movimento processual. Outra noção importante para compreender o conceito de progresso, portanto, é a temporização, ou ainda, o “descobrimento do tempo histórico como processo” ( KOSELLECK, 2012KOSELLECK, Reinhart. Historias de conceptos: estúdios sobre semantica y pragmática del linguaje. Madrid: Editorial Trotta, 2012., p. 104).

A noção do progresso como um sujeito, como algo que transforma a despeito dos homens (mesmo que também a partir de suas ações), é então compreendida como universal, agredindo todas as outras diversas etnias, epistemes e cosmovisões que não se adequavam a estas perspectivas. Ou seja, a partir de então foi entendida como “sujeito transpersonal da ação” não apenas para a ciência e a técnica, mas também para a arte, as organizações sociais, a política, etc. Passou a ser percebido, por conseguinte, como progresso da humanidade, e não como algo específico a um determinado grupo. Dito isto, emergiu também a compreensão da humanidade como sujeito coletivo e ativo. Até então, os progressos eram entendidos como progressos particulares, de indivíduos, grupos ou civilizações específicas ( KOSELLECK, 2012KOSELLECK, Reinhart. Historias de conceptos: estúdios sobre semantica y pragmática del linguaje. Madrid: Editorial Trotta, 2012., p. 106).

Segundo autores como Elias Palti (2014PALTI, Elias José. Las Ideas fuera de lugar? Buenos Aires: Prometeo Libros, 2014.) e Julio Ramos (2009RAMOS, Julio. Desencuentros de la modernidad en América Latina. Caracas: Fundación Editorial El perro y la rana, 2009. ), estas perspectivas modernas, criadas não somente na Europa, mas através de uma circularidade de ideias nos mais diversos espaços, são, apesar destas interações, parte de um movimento violento de um esforço de dominação e universalização de ideais civilizacionais eurocêntricos. São, portanto, parte de um imaginário colonizador que se via como superior e salvacionista em relação às outras formas de pensar e existir das mais diversas culturas, produzindo uma ideologia falaciosa da episteme única e da nação monoétnica. Como parte destes fenômenos históricos, sinalizo a diversidade das resistências das mais ricas e diferentes etnias e culturas (como os mais de 300 povos originários no território brasileiro) que se opõe a estes esforços homogeneizantes, que disputam, que ressignificam, que negociam e disponibilizam suas próprias compreensões e valores nestes processos.

No final do XIX, a ideia de progresso começou a cair em certo descrédito por parecer não se realizar de forma inevitável, ou ainda por beneficiar apenas determinados setores da sociedade ou povos em detrimento de outros. A própria técnica começa a também ser compreendida como um espaço que pode, de certa forma, provocar tragédias, como o exemplo da tecnologia bélica ( KOSELLECK, 2012KOSELLECK, Reinhart. Historias de conceptos: estúdios sobre semantica y pragmática del linguaje. Madrid: Editorial Trotta, 2012., p. 110-111). Anteriormente ao início do século XX, esta desconfiança no que diz respeito ao progresso linear e/ou descontínuo já se mostrava esporadicamente, como nas obras de Rousseau, Diderot, Voltaire e Kant ( FERREIRA, 2019FERREIRA, Clayton J. A Noção de Progresso em O Brasil na História de Manoel Bomfim. Expedições: Teoria da História e Historiografia, v. 10, p. 1-19, 2019. nº 3, São Paulo. Disponível em: < Disponível em: https://www.revista.ueg.br/index.php/revista_geth/article/view/9238 >. Acesso em 23/08/2022
https://www.revista.ueg.br/index.php/rev...
, p. 3-5). Ainda que a noção de progresso parecia não possuir limites na projeção de futuros, isto também abria a perspectiva de que uma série ilimitada de males poderiam ser produzidos ( KOSELLECK, 2012KOSELLECK, Reinhart. Historias de conceptos: estúdios sobre semantica y pragmática del linguaje. Madrid: Editorial Trotta, 2012., p. 110).

O progresso no ensaio e o ensaísta no progresso

Apesar de ser um conceito central na obra de Prado, o autor de Retrato do Brasil não procurou definir de forma direta a noção de progresso, de modo que esta ideia perpassa as narrativas em seu livro. Sua ideia de civilização e progresso é parte deste movimento que quer se universalizar e dissipar epistemes discordantes. O suporte da maior parte de seus argumentos depende da ideia moderna de uma história globalizante, ou melhor, a história como um singular coletivo que reúne todos os povos na perspectiva de um “desenvolvimento civilizacional” da espécie humana, onde povos, grupos ou indivíduos podem contribuir para tal. 3 3 É sempre necessário lembrar e, portanto, não silenciar as diversas violências produzidas a partir do ideal civilizacional eurocêntrico moderno. Os processos históricos os quais culminaram com a Renascença e a Reforma são exemplares acerca desta compreensão em seu texto. Para o autor, estas experiências reuniram o Ocidente ao modificá-lo de forma conjunta, mesmo a partir de eventualidades as quais aparentemente possuíam importância local. Estes processos apontariam para a valorização do indivíduo e da liberdade, sendo um movimento próprio à modernidade.

A Renascença e a Reforma modificavam por seu turno a estrutura social e moral da civilização ocidental. Pactos aparentemente isolados viriam a ter um significado que os contemporâneos não percebiam. Assim, no mesmo ano em que Cortez sitiava a cidade do México, Lutero queimava em Wittenberg a bula do Papa. Havia no ar, com a surpresa das descobertas, um espírito de renovação e de revolta, precursor de novas ideias e de homens novos ( PRADO, 1928PRADO, Paulo. Retrato do Brasil: ensaio sobre a tristeza brasileira. São Paulo: Oficinas Gráficas Duprat-Mayença (reunidas), 1928., p. 113). 4 4 Para melhor leitura dos textos que estamos tratando, atualizamos sua grafia.

Para Prado o progresso seria o resultado temporal e coletivo dos saberes diversos, da ética, ciências, artes, técnicas, capacidade de organização social, econômica, etc. Estes conhecimentos se acumulam, mas também podem ser perdidos. Prado também percebe que o progresso não se encontra disponível para todas as sociedades e suas estratificações. O paulista entende que a realização de progressos depende de uma organização bem fundamentada (historicamente, sentimentalmente, eticamente, socialmente etc.) da ação dos sujeitos, que não se realiza, portanto, a despeito dos homens. Portanto, para Prado, a compreensão de progresso se encontra no interior de uma ideologia civilizacional universalista a qual quer impor um modo de vida em torno da técnica, do trabalho e do consumo para todas as culturas ( WALLERSTEIN, 2007WALLERSTEIN, Immanuel. O universalismo europeu: a retórica do poder. São Paulo: Boitempo, 2007. ). Ainda, o progresso é entendido como algo que produz algum sentido para os processos históricos da modernidade, mas não se efetiva necessariamente e nem de forma linear. Ou seja, Prado não percebe o progresso como uma filosofia da história.

A noção de progresso do autor de Retrato do Brasil também se relaciona com a posição que ocupava na elite cafeicultura e industrial paulista. Esta, considerada por alguns como manifestação do que havia de mais moderno no Brasil, ou ainda, daquilo que o progresso técnico poderia proporcionar de melhor. É a partir desta posição social que Mario de Andrade justifica a importância de Prado no movimento intelectual do modernismo. Berriel salienta que, para Mario de Andrade, a Semana de Arte Moderna só poderia ser em São Paulo, já que no Rio havia a alta burguesia, fruto da monarquia, da relação com o império. Em São Paulo, havia uma aristocracia tradicional associada à produção rural e industrial da qual Paulo Prado era um exemplar. Para Andrade, portanto, o movimento modernista era aristocrático. E assim, concluía que a burguesia carioca resultante da monarquia enxergava o modernismo como ameaça, pois era expressão de uma aristocracia tradicional paulista que a antagonizava, que questionava sua hegemonia ( BERRIEL, 1994BERRIEL, Carlos Eduardo Ornelas. Tietê, Tejo, Sena: a obra de Paulo Prado. Tese (Doutorado em Teoria Literária) - Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1994. p. 258, p. 81-82).

Aqui, o Rio de Janeiro era compreendido por Andrade como internacionalista, uma capital marítima burguesa, resultado da monarquia, sede de academias (como a Academia Brasileira de Letras) comprometidas com a continuidade cultural monárquica. São Paulo era regionalista, produto de um processo de isolamento geográfico e provinciano que produziu uma aristocracia rural e, posteriormente, o comércio industrial, um espaço característico da contemporaneidade técnica do século XX ( BERRIEL, 1994BERRIEL, Carlos Eduardo Ornelas. Tietê, Tejo, Sena: a obra de Paulo Prado. Tese (Doutorado em Teoria Literária) - Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1994. p. 258, p. 85-86). Tratava-se de aristocracia vs burguesia. E como Paulo Prado era expressão desse espírito aristocrático, segundo Berriel, “fica, portanto, superada a qualificação redutora que o via apenas como um mecenas, um ricaço disponível que se divertia com a iconoclastia dos jovens artistas” ( BERRIEL, 1994BERRIEL, Carlos Eduardo Ornelas. Tietê, Tejo, Sena: a obra de Paulo Prado. Tese (Doutorado em Teoria Literária) - Instituto de Estudos da Linguagem, Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 1994. p. 258, p. 86).

Saliento que a aproximação de Prado com parte do movimento modernista e com as artes em geral também faz parte de determinada pragmática do autor. Sua narrativa elabora diversos elementos estéticos, ou seja, sua escrita descreve a materialidade de espaços, cheiros, texturas, indica sentimentos, etc. Estas escolhas sensoriais e afetivas, mais do que conferir status de arte à sua obra, buscam aproximar o leitor da sua narrativa e argumentações para, posteriormente, instigá-lo à reflexão e ação. Ou ainda, como escreveu Henrique Gaio, “até mesmo as questões estéticas apresentam-se sempre subordinadas, em Paulo Prado, ao sentimento nacionalista, a um ideal de modernização, ao âmbito da ação em defesa de uma máquina pública eficiente e capaz de estimular o progresso do país” ( GAIO, 2008GAIO, Henrique Pinheiro Costa. Pessimismo e Ruína: um retrato essencial do Brasil. 2008. Dissertação (Mestrado em História) - Centro de Ciências Sociais, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2008. , p. 12).

A partir disso, a compreensão da tese principal de Prado depende diretamente do entendimento da experiência não linear ou universal do progresso. A saber, a tese central do ensaio Retrato do Brasil é a de que os processos históricos da colonização resultaram na exacerbação do “individualismo” e, portanto, da “luxúria” e da “cobiça” no Brasil, culminando em uma cultura marcada pelo que chama de “tristeza”. Esta caracterização de uma tristeza nacional me parece parte do movimento eurocêntrico moderno. Portanto, vai ao encontro do falacioso topos do suposto atraso dos países considerados marginais em relação a perspectiva colonizadora europeia, como se houvesse uma marcha linear, estágios para um caminho civilizacional, como se a colonização não tivesse produzido uma infinidade de violências nestes espaços. Como aponta a pesquisadora Yara Andrade, “o colonizador, para Paulo Prado, era portador de graves defeitos, como individualistas e devasso” e o “objetivo desses aventureiros não era a formação de um país, mas somente amealhar riqueza fácil para gozá-la na corte portuguesa” ( ANDRADE, 2008ANDRADE, Yara Rodrigues de. (Im)possível nação: o Brasil de Manoel Bomfim e de Paulo Prado no início do século XX. 2008. Dissertação (Mestrado em Ciências Sociais) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2008. p. 128., p. 44). Mais do que isto, Prado constantemente afirmava que na colônia portuguesa americana, “estabeleceu-se um regime escravocrata que contaminou as relações inter-raciais”, e a partir de então, este espaço “sofreu com os males causados pela ambição e luxúria dos colonizadores. Exagerou no ‘culto ao vício sexual’, até suas forças se exaurirem e sua unidade moral se dissolver” ( GIL, 1994GIL, Gilson. Gilberto Freyre versus Paulo Prado: a questão da identidade nacional brasileira. Ci. & Tróp. v. 22, n. 2, p. 211-220, jul./dez. 1994, São Paulo. Disponível em: < Disponível em: https://periodicos.fundaj.gov.br/CIC/article/view/565 >. Acesso em 23/08/2022.
https://periodicos.fundaj.gov.br/CIC/art...
, p. 2013). 5 5 É preciso apontar que Prado é parte de uma historicidade onde há hegemonia de uma cultura intelectual elitizada, patriarcal e socialmente branca. Mesmo assim, houve a resistência de diversos intelectuais que se encontravam em espaços sociais, étnicos, culturais, econômicos e de gênero diversos, como é o caso dos intelectuais negros Manuel Querino, Theodoro Sampaio, Edson Carneiro e Evaristo de Moraes e das intelectuais Amélia de Resende Martins, Mariana Coelho e Virgínia Cortes de Lacerda. Destaco também que, ainda que Prado tenha escrito em Retrato do Brasil que percebe certa igualdade entre “as raças”, seu ensaio repete o gesto que não confere protagonismo às etnias dos povos originários e dos africanos e afro-brasileiros nos processos históricos da colonização, da monarquia e do regime republicano. Ainda pior, Prado atribui a luxúria exacerbada como característica dos “indígenas”, a qual pensa que teria sido passada aos colonos europeus.

Para Prado, o progresso pôde não se constituir em determinados espaços, e para reverter isso, seria preciso uma comoção social para instigar as ações dos sujeitos - ou seja, o progresso não ocorre como um “sujeito transpersonal da ação”. Portanto, para ele houve pouca produção de progressos durante a colonização do espaço que chamamos hoje de Brasil, devido a intensificação dos impulsos egocêntricos e a falta de instituições que mediassem o individualismo.

Pelas costas do oceano, e em manchas de civilização material, nos planaltos da serra do Mar, da Mantiqueira e nos campos do Sul, o progresso é uma indústria que, como na China, é explorada, numa rápida absorção, pelos capitães estrangeiros e os poucos grupos financeiros nacionais que só cogitam - como é natural - dos próprios interesses. [...] Nesse afã, porém, a administração pública faliu, não podendo acompanhar o movimento progressista, ora lento, ora impetuoso. E assoberbado, num afobamento tonto, ficou atrás: é quase um empecilho e um trambolho. No resto do país o caso se agrava: os homens, de incapazes, tornaram-se desonestos e pela cumplicidade dos apaziguamentos eleitorais, aceitaram com pequena relutância o consórcio das funções administrativas com os interesses mercantis ( PRADO, 1928PRADO, Paulo. Retrato do Brasil: ensaio sobre a tristeza brasileira. São Paulo: Oficinas Gráficas Duprat-Mayença (reunidas), 1928., p. 203).

Nesta instabilidade pulsante, acelerada, que se transforma, ou como escreveu Prado, “neste afã” ou “afobamento tonto”, o movimento do progresso entre lento ou “impetuoso” (onde a administração pública, importante para seu desenvolvimento “ficou atrás”), diz respeito a pressão das experiências históricas as quais sedimentaram condições específicas para o presente, como o individualismo, a falta de sociabilidade, a tristeza, a dificuldade do agir conjunto. A experiência de tempo acelerado dificulta, também, a formatação de um progresso intenso.

Natureza, progresso e escrita da história

É crucial perceber que o progresso mercantil, para Prado, traz melhorias somente a determinados setores, e que o progresso, em sua realização, não o é para todas as camadas sociais e espaços territoriais. A desconfiança quanto a um progresso sequenciado marca seu texto. Esta insegurança se encontra em consequências desastrosas de alguns desenvolvimentos técnicos. Mas a incerteza quanto ao progresso é constituída, principalmente, devido a compreensão de que há falta de equilíbrio entre cultura afetiva e institucional que resulte em uma forte sociabilidade, encorajando tanto o nível individual quanto comunitário e social.

A crítica de que muitos dos progressos que se constituíram seriam apenas mercantis e se limitariam somente à elite econômica, vai ao encontro do “humanismo comercial” de Pocock - a ideia de que o comércio pode corromper a ética humana ( POCOCK, 1975POCOCK, John G. A. The machiavellian moment. Princeton, Princeton University Press, 1975.). O impulso mercantil exagerado dos portugueses, ou melhor, a cobiça (um comportamento apontado como parte daquela historicidade), produziria certa inadequação da relação humana com a natureza, certa incapacidade de apreciá-la e de se adaptar a ela, a observando somente como produto para o comércio.

Águas e matas foram a surpresa e o encanto dos descobridores. Da beleza das paisagens não cuidavam. Não era, nem do tempo nem da raça, o amor a natureza. Camões não soube ver e apreciar os encantos da vegetação tropical: só os interessavam as especiarias e os produtos comerciais. Humboldt nota que na sua ilha encantada só descreve plantas europeias. A mesma indiferença ou incompreensão é notável nos que aqui primeiro enfrentaram a terra recém-chegada ( PRADO, 1928PRADO, Paulo. Retrato do Brasil: ensaio sobre a tristeza brasileira. São Paulo: Oficinas Gráficas Duprat-Mayença (reunidas), 1928., p. 20).

A natureza vislumbrada pelos navegadores portugueses é apresentada pelo autor de forma descomunal, constituída por diversos elementos que dificultam cada ação humana.

No Brasil, a mata cobria as terras moles da bacia amazônica, e a partir da barra do S. Francisco, depois das dunas e mangues do Nordeste, seguia o litoral até muito além do Capricórnio para terminar nas praias baixas do Rio Grande. Oferecia um obstáculo formidável para quem a queria penetrar e atravessar, como que exprimindo a opressiva tirania da natureza a que dificilmente se foge no envolvimento flexível e resistente das lianas. Compacta, sombria, silenciosa, monótona na humidade pesada, abafa, sufoca e asfixia o invasor que se perde no claro escuro esverdeado de suas profundezas. [...] Na zona equatorial do Brasil o clima constantemente úmido e quente desenvolve uma força e violência de vegetação incomparável ( PRADO, 1928PRADO, Paulo. Retrato do Brasil: ensaio sobre a tristeza brasileira. São Paulo: Oficinas Gráficas Duprat-Mayença (reunidas), 1928., p. 16).

Prado acreditava que a grandiosidade da natureza e a falta das instituições que mediassem as ações dos sujeitos (aquelas conhecidas na Europa) imediatamente cooptavam os colonizadores a agir de forma viciosa, de modo egocêntrico, ao invés de buscar a realização de uma comunidade coesa. Desta forma, “todos sofriam a sedução dos trópicos, vivendo intensamente uma vida animal e bebendo com delícia um ar como que até então irrespirado” ( PRADO, 1928PRADO, Paulo. Retrato do Brasil: ensaio sobre a tristeza brasileira. São Paulo: Oficinas Gráficas Duprat-Mayença (reunidas), 1928., p. 21).

As compreensões acerca do progresso na obra de Prado dialogam especialmente com três autores: Graça Aranha, Capistrano de Abreu e Henry Buckle. Como Eliana Dutra nos informa, para os três, o progresso humano está diretamente atrelado à relação humana com a natureza, os percebendo como entidades separadas. Segundo Graça Aranha, a natureza imponente e colossal do espaço que viria a ser o Brasil causava uma sensação opressiva, de medo, o que produzia um misticismo nas mentalidades. Transformar a natureza, especialmente através da arte, e não somente pela técnica, seria uma forma de desmistificá-la, de superar a inanição que supostamente causava aos sujeitos. Segundo Dutra, Graça Aranha entendia que:

[...] vencer a natureza, que o apavora provocando sua exaltação mística, e o esmaga através da sua grandeza descomunal, era um mandamento moral, um trabalho que o homem brasileiro deveria realizar para atingir sua vitória espiritual com uma concepção estética do universo. Por isso o autor destaca o papel da arte como transformadora da natureza ( DUTRA, 2000DUTRA, Eliana de Freitas. O não ser e o ser outro: Paulo Prado e seu Retrato do Brasil. Revista Estudos Históricos, v. 14, n. 26, p. 233-252, 2000, São Paulo,Disponível em: < Disponível em: https://periodicos.fgv.br/reh/article/view/2124 >. Acesso em 23/08/2022.
https://periodicos.fgv.br/reh/article/vi...
, p. 242).

Mas não era preciso somente dominar a natureza, mas também, se adequar a ela:

Entretanto, se a noção de cultura elaborada por Graça Aranha pressupõe, de um lado, o domínio da natureza pelo homem, de outro ela pressupõe a adequação do homem à natureza, sua incorporação à terra. A ausência de um equilíbrio entre o homem e o meio físico seria um impedimento à manifestação do nosso espírito superior, universal e independente ( DUTRA, 2000DUTRA, Eliana de Freitas. O não ser e o ser outro: Paulo Prado e seu Retrato do Brasil. Revista Estudos Históricos, v. 14, n. 26, p. 233-252, 2000, São Paulo,Disponível em: < Disponível em: https://periodicos.fgv.br/reh/article/view/2124 >. Acesso em 23/08/2022.
https://periodicos.fgv.br/reh/article/vi...
, p. 247).

É conhecida a relação de mestre e amigo que Prado cultivava com o historiador Capistrano de Abreu. Para Dutra, o trabalho de Abreu ia na direção das conclusões de Buckle, o qual concluiu que a natureza imponente dificulta ou impede a civilização, claro, aos moldes eurocêntricos, antropocêntricos, universalistas que na maior parte das vezes são epstemicidas e etnocidas em relação às formas outras de se perceber as realidades em culturas diversas.

Através do retrato do impasse que desenha, vemos Paulo Prado se afastar de Graça Aranha - este, cioso do bom resultado dos trabalhos do homem brasileiro rumo à edificação de uma cultura nacional e se colocar de acordo com seu mestre Capistrano de Abreu. Não é demais lembrar que Abreu (1976 [1876]) - inspirado nas teorias mesológicas do historiador inglês Henry Thomas Buckle, as quais explicavam a personalidade dos povos em função das relações estabelecidas com a natureza e com os fatores físicos, a exemplo do clima, da alimentação e do solo - conclui, com Buckle, que no Brasil cultura e natureza se excluem, dada a opressão exercida pelo meio físico sobre o homem. O clima quente, por exemplo, seria um impedimento poderoso ao desenvolvimento moral e cultural ( DUTRA, 2000DUTRA, Eliana de Freitas. O não ser e o ser outro: Paulo Prado e seu Retrato do Brasil. Revista Estudos Históricos, v. 14, n. 26, p. 233-252, 2000, São Paulo,Disponível em: < Disponível em: https://periodicos.fgv.br/reh/article/view/2124 >. Acesso em 23/08/2022.
https://periodicos.fgv.br/reh/article/vi...
, p. 247).

A natureza era entendida pelo autor como um gigante desafiador, ainda que possuísse grande, diversa e colorida beleza, como apontou Carmem Felgueiras (2022FELGUEIRAS, Carmem. Paulo Prado: desordem, desmesura e descontrole na formação do Brasil. Lua Nova, n. 115, jan./abr., 2022, p. 13-42, nº 115, São Paulo. Disponível em: < Disponível em: https://www.scielo.br/j/ln/a/6wR8xXtDWzbYZqWWXdpkJBt/?format=pdf⟨=ptl >. Acesso em 23/08/2022.
https://www.scielo.br/j/ln/a/6wR8xXtDWzb...
). Ao confrontar os desafios da natureza, os colonizadores teriam produzido grande destruição, mas ainda assim, ao reificar o argumento eurocêntrico de natureza vs civilização, Felgueiras nos esclarece que, em Retrato do Brasil, há uma preocupação em tratar a natureza como patrimônio nacional. A diversidade e especificidades da natureza seria, então, algo importante, ao menos de modo utilitarista, pensando a natureza como fonte de recursos, onde os humanos (ao menos os ocidentalizados, europeizados) se encontrariam apartados dela, como algo superior.

Parece-me que Prado não concluía a impossibilidade, mas a grande dificuldade do desenvolvimento humano frente a esta natureza colossal, do qual era necessária uma tarefa constante e dispendiosa de desenvolvimento institucional para equilibrar os impulsos viciosos que se estabeleceram através da luxúria e da cobiça colonial. Para o paulista, os bandeirantes teriam realizado parte desta tarefa, ao se adaptar a aquele espaço, trocando conhecimento com os povos originários (sendo muitos deles filhos de indígenas), ainda que mesmo assim, “[...] no anseio do enriquecimento cometeram todos os crimes que os homens dessa época praticavam para a satisfação de suas paixões” ( PRADO, 1928PRADO, Paulo. Retrato do Brasil: ensaio sobre a tristeza brasileira. São Paulo: Oficinas Gráficas Duprat-Mayença (reunidas), 1928., p. 105). Alinhado ao eurocentrismo europeu, é importante dizer que Prado parece compreender que os povos originários (do passado, pois ele nem menciona os do seu presente) se encontravam em um estágio civilizacional inferior, e que os bandeirantes, mesmo os filhos de etnias deste território, já se encontravam em níveis superiores, não poderiam ser mais compreendidos como originários.

Nesta direção, Prado acreditava que os bandeirantes possuíam elementos importantes para o que entende como desenvolvimento civilizacional e realização de progressos no interior do ideal civilizacional eurocêntrico, como “Interesse, Dinamismo, Energia, Curiosidade, Ambição” ( PRADO, 1928PRADO, Paulo. Retrato do Brasil: ensaio sobre a tristeza brasileira. São Paulo: Oficinas Gráficas Duprat-Mayença (reunidas), 1928., p. 105). Mais ainda, para ele, os bandeirantes representavam o que pensava ser “uma força de heroísmo anônimo e individualista, decisiva na integração do território” ( PRADO, 1928PRADO, Paulo. Retrato do Brasil: ensaio sobre a tristeza brasileira. São Paulo: Oficinas Gráficas Duprat-Mayença (reunidas), 1928., p. 79). Ainda assim, Prado concluía que estes elementos foram minados pela falta de instituições que mediassem as atitudes viciosas e egocêntricas neste espaço onde a natureza impunha diversas dificuldades.

Seu texto também aponta a escravidão como um terrível processo histórico que produziu consequências gravíssimas para a população negra, um holocausto como sabemos, que teve consequências desastrosas para a estruturação balanceada da sociedade. O sistema escravista no Brasil é percebido como parte de uma terrível estrutura econômica e social equivocada, que corrompeu a sociabilidade entre os sujeitos. A escravidão é representada como aquela que se intensificou e ramificou por um longo período, não declinando de forma “natural”, de modo independente das ações humanas, mas somente através delas. Seria outro aspecto que salienta a compreensão da não linearidade do progresso para Prado.

O negro, porém, além de elemento étnico, representou na formação nacional outro fator de imensa influência: foi escravo. Um dos horrores da escravidão é que o cativo, além de não ter a propriedade do seu corpo, perde também a propriedade de sua alma. Essa fraqueza transformou-se em função catalítica no organismo social: reduziu á própria miséria moral e sentimental do negro a ilusória superioridade do senhor de escravos. Vimos nos diferentes séculos a que ponto de infiltração chegou na sociedade colonial o predomínio do africano e do mulato. Nos tempos de hoje nos esquecemos que de que há poucas décadas de ano ainda viviam no país cerca de dois milhões de escravos, numa população total de quatorze milhões - de que uma boa parte era de mestiços. Na promiscuidade do convívio, verificava-se que a escravidão foi sempre a imoralidade, a preguiça, o desprezo da dignidade humana, a incultura, o vício protegido pela lei, os desleixos nos costumes, o desperdício, a imprevidência, a subserviência ao chicote, o beija-mão ao poderoso - todas as falhas que constituíram o que um publicista chamou a filosofia da senzala, em maior ou menor escala latente nas profundezas inconfessáveis do caráter nacional ( PRADO, 1928PRADO, Paulo. Retrato do Brasil: ensaio sobre a tristeza brasileira. São Paulo: Oficinas Gráficas Duprat-Mayença (reunidas), 1928., p. 194).

Suas perspectivas constroem o argumento de que, para o funcionamento orgânico do corpo social, não devem ser criadas estruturas as quais oprimam o sujeito, ao mesmo tempo em que estes não devem exacerbar sua individualidade a ponto de se tornarem egoístas. Ou seja, é necessário produzir condições para que os sujeitos invistam sua energia, ou em termos freudianos utilizados por Prado, sua pulsão. Em sua contemporaneidade, Prado entende que “na desordem da incompetência, do peculato, da tirania, da cobiça, perderam-se as normas mais comezinhas na direção dos negócios públicos” ( PRADO, 1928PRADO, Paulo. Retrato do Brasil: ensaio sobre a tristeza brasileira. São Paulo: Oficinas Gráficas Duprat-Mayença (reunidas), 1928., p. 203). Temos como resultado que a condição de realização do progresso depende diretamente da capacidade de sociabilidade de um determinado povo (indivíduos unidos por aspectos de identidade, afetivos, territoriais, tradições, memórias, experiências históricas, leis, status político etc.). Nestas circunstâncias, a experiência de tempo não deve intensificar sua aceleração para empreender progressos, o que produziria maior destemperança.

No seu ensaio, a ideia de atraso se encontra associada ao desequilíbrio gerado ao longo de transformações sucessivas (aceleração, instabilidade), especialmente processos históricos os quais não sedimentaram proporcionalidade entre os sentimentos e ações modernas de liberdade/individualidade e as instituições. O rumo do progresso poderia ser inspirado a partir das próprias experiências históricas consideradas potencializadoras, tentando diminuir sua distância histórica em relação ao presente. Do mesmo modo, era preciso evidenciar e intensificar a distância em relação ao passado o qual engessou estes desequilíbrios.

Esta capacidade de funcionamento social orgânico não destrói as disputas e antagonismos, apenas concebe uma maior habilidade de coesão, de decisão conjunta. Em Retrato do Brasil, portanto, há a ideia de que é preciso investir no progresso a partir do entendimento de ritmos próprios, das especificidades históricas, culturais, sociais, políticas, éticas, afetivas, etc. Este ensaio tematiza o progresso de uma forma específica, entendendo que para alcançá-lo é preciso adequar a experiência de tempo à história e à historicidade de um determinado espaço-tempo.

Um outro movimento acerca da compreensão de progresso de Prado se encontra de forma mais acentuada na última seção do ensaio, o post-scriptum. De forma bastante irônica, o paulista afirma que após a Guerra ou da Revolução (escritas com letra maiúsculas, como imperativos) existiria alguma possibilidade, mesmo que remota, de reordenamento das condições históricas, materiais e afetivas de uma sociedade as quais, posteriormente, poderiam produzir condições para futuros progressos.

Para tão grandes males parecem esgotadas as medicações da terapêutica corrente: é necessário recorrer á cirurgia. Filosoficamente falando - sem se cuidar da realidade social e política da atualidade - só duas soluções poderão impedir o desmembramento do país e a sua desaparição como um todo criado pelas circunstâncias históricas, duas soluções catastróficas: a Guerra, a Revolução ( PRADO, 1928PRADO, Paulo. Retrato do Brasil: ensaio sobre a tristeza brasileira. São Paulo: Oficinas Gráficas Duprat-Mayença (reunidas), 1928., p. 212).

Entendo que esta oratória irônica se desenvolve a partir do momento em que Prado quer novamente provocar, ao mencionar que os egoísmos, especialmente da classe política que negligencia as causas públicas, pode culminar em revoltas violentas, em catástrofes. Seriam consequências desastrosas que poderiam eclodir ao não “cuidar da realidade social e política da atualidade” ( PRADO, 1928PRADO, Paulo. Retrato do Brasil: ensaio sobre a tristeza brasileira. São Paulo: Oficinas Gráficas Duprat-Mayença (reunidas), 1928., p. 212). Ou seja, o autor quer instigar o leitor a se atentar a gravidade do descaso social, as adversidades políticas e as suas possíveis futuras consequências. Esta situação de Guerra ou Revolução seria, portanto, ainda mais incerta, pois, ao menos a princípio, intensificaria a instabilidade social, econômica, política e temporal, ao romper de forma agressiva diversas relações estabelecidas com experiências passadas, o que produz uma situação de incertezas ainda mais salientes ao reduzir o espaço de experiências e horizontes de expectativas, simultaneamente.

É de forma semelhante que Skinner acredita na necessidade de aproximação entre a razão e a oratória. Para ele, é por meio desta aproximação que Hobbes teria produzido discursos persuasivos em torno do debate acerca da sociedade civil e do direito natural, já que ele compreendia que o momento histórico em que vivia não era propício à visualização da importância destas questões.

Hobbes viu-se obrigado, no Leviatã, a enfrentar um novo conjunto de perguntas sobre a natureza da scientia civilis, um conjunto de perguntas que, anteriormente, ele não vira nenhuma razão para formular. Se as descobertas da ciência civil não possuem nenhum poder intrínseco de convencer, que esperança teremos nós de implementá-las? Como é possível ter esperança de conquistar a atenção e o assentimento, especialmente daqueles cujas paixões e cuja ignorância são capazes de fazê-los repudiar até mesmo as mais claras provas científicas? ( SKINNER, 1999SKINNER, Quentin. Razão e retórica na filosofia de Hobbes. São Paulo: Editora da Unesp, 1999., p. 465-466).

É também a partir desta persuasão irônica que Prado finaliza seu ensaio da seguinte forma:

O revolucionário, porém, como construtor de uma nova ordem é por sua vez um otimista que ainda acredita, pelo progresso natural do homem, numa melhoria em relação ao presente. É o que me faz encerrar estas páginas com um pensamento de reconforto: a confiança no futuro que não pode ser pior do que no passado ( PRADO, 1928PRADO, Paulo. Retrato do Brasil: ensaio sobre a tristeza brasileira. São Paulo: Oficinas Gráficas Duprat-Mayença (reunidas), 1928., p. 216).

Não me parece, por entre todos os outros argumentos acerca das incertezas das consequências dos processos históricos e o sarcasmo no encerramento do seu livro, que Prado acredita em uma metanarrativa do progresso ao mencionar a ideia de um “otimista” que apesar de tudo “ainda acredita, pelo progresso natural do homem, numa melhoria em relação ao presente” ( PRADO, 1928PRADO, Paulo. Retrato do Brasil: ensaio sobre a tristeza brasileira. São Paulo: Oficinas Gráficas Duprat-Mayença (reunidas), 1928., p. 216). De todo modo, o progresso, em Retrato do Brasil, depende das ações dos sujeitos, e, portanto, não é um “sujeito transpersonal da ação”, não se realiza a despeito das ações humanas, não é uma filosofia da história.

O desenvolvimento humano (progresso), para o paulista, também se encontra diretamente vinculado à pressão realizada pelas experiências passadas e a possibilidade de sua rearticulação, tanto a nível individual como social (no interior de suas heterogeneidades) na criação de projetos de ação. Para tal, é preciso produzir conhecimento e reflexões acerca do passado. Portanto, um movimento de rompimento com a herança estagnante da Europa da era colonial e imperialista não quer dizer uma superação do passado ou da história, não se trata de abandono da história como potencializadora das ações do presente. Inclusive, segundo Henrique Gaio, esta perspectiva que tensiona certos passados no presente, que quer se aproximar de algumas experiências enquanto repele outras, não era exclusiva de Prado, mas uma característica de parte dos intelectuais que se envolveram com o movimento modernista ( GAIO, 2008GAIO, Henrique Pinheiro Costa. Pessimismo e Ruína: um retrato essencial do Brasil. 2008. Dissertação (Mestrado em História) - Centro de Ciências Sociais, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2008. , p. 21).

A necessidade de produzir um saber histórico que interprete experiências passadas se encontra nas perspectivas políticas e éticas de Prado: a história precisa por os indivíduos do presente em movimento, reordenar sua relação afetiva em relação as experiências potencializadoras e se distanciar daquelas consideradas negativas. Do mesmo modo, para ele, o conhecimento histórico precisa produzir reflexões sobre as configurações deste presente através das pressões exercidas pelo passado. Para o ensaísta, seria o que os historiadores alemães entenderiam como uma escrita da história do Brasil pragmática.

Considerações finais

Para sistematizar a relação entre progresso e escrita da história no ensaio de Prado, gostaria de apontar novamente alguns enunciados acerca da experiência moderna através do trabalho de Koselleck. Após isso, buscarei salientar como os aspectos da modernidade do início do século XX brasileiro são tematizados em Retrato do Brasil, ou seja, como e qual progresso e história são articulados na especificidade temporal e espacial do paulista. Destaco que o ensaio de Prado, assim como toda obra, artística, científica ou de outra natureza, é entendido aqui como parte de uma historicidade, e não como consequência ou resposta apartada de uma realidade espaço temporal. Como nos alerta LaCapra, texto e contexto não devem ser compreendidos de forma separada ( LACAPRA, 1990LACAPRA, Dominick. Rethinking Intellectual History: texts, contexts, language. Londres: Cornell University Press, 1990.).

De forma geral, Koselleck compreende que durante a configuração da experiência moderna o tempo foi sendo experimentado como aquele que transforma as experiências constantemente. O passado e o futuro se distanciavam e diferenciavam, causando estranhamento entre eles - efeito o qual nunca se realiza de forma extrema, já que não pode haver rompimento completo entre “espaço de experiências” e “horizonte de expectativas” ( KOSELLECK, 2006KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: Contribuição à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto; Editora PUC/RJ, 2006., p. 305-329). Esta distância era marcada por um fator qualitativo, onde o futuro seria melhor que o passado. O tempo era vivenciado como acelerado e a aceleração era entendida como tarefa para a transformação terrena na busca pelo melhor para o ser humano, claro, a partir dos valores eurocêntricos, colonizadores, universalistas.

O futuro foi marcado pelo desconhecido e o presente era curto, pois sempre se estava em direção ao futuro. O tempo, ao fim, foi percebido como algo linear para grande parte dos sujeitos no interior desta lógica moderna eurocêntrica. Com os processos de colonização e as circularidades de ideias, esta experiência acelerada acerca da modernidade se consolidou e sedimentou em vários espaços, sempre com suas especificidades e ressignificações locais. Portanto, ainda que a ideologia universalista tenha violentado as diversidades étnicas, epistemes e cosmovisões, ela não soterrou completamente outras formas de percepção temporal em diversos espaços, sociedades e culturas.

No interior de suas singularidades, encontramos características modernas semelhantes em Retrato do Brasil - o que acredito caracterizar possibilidades de compreensões de parte significativa da comunidade letrada do início do século XX brasileiro. Aqui, o passado e futuro se diferenciam, no entanto, o passado pressiona o presente e o futuro, produz afetação, se faz presente. Do mesmo modo, em sua contemporaneidade própria, Prado entende que os indivíduos produzem e buscam certa proximidade com o passado: estes movimentos se retroalimentam e são realizados pela escrita da história, pelas memórias, as tradições, os objetos do passado remanescentes em sua existência material, etc. A aceleração pode e produz instabilidade e, devido a isto, as relações entre presente e passado possuem, simultaneamente, uma capacidade de certa sedimentação (continuidades) e transformação (movimento): por isto, a escrita da história, as memórias, as tradições, os objetos e tantos outros podem rearranjar parte das relações com as experiências passadas. No interior destes atributos, é possível intensificar certas distâncias com o passado e reduzir outras tematizando experiências diversas.

Mas Prado desconfia acerca da capacidade de realização das metanarrativas (filosofias da história), o que dificulta, quando não inviabiliza, a perspectiva de que o futuro será sempre melhor que o passado. O tempo é experimentado como acelerado, mas não como uma aceleração que, necessariamente, intensifica processos de melhora das realidades humanas: a aceleração é vivenciada, também, como aquilo o qual pode levar a instabilidade, onde as metanarrativas podem não se realizar, ou pior, podem resultar em consequências negativas (como quando a capacidade técnica expande a capacidade bélica). Devido a este ponto, a aceleração não é entendida como aquela que impreterivelmente transforma qualitativamente, o que torna necessário certa consciência das experiências do passado para a posterior análise e reflexões que podem buscar alternativas de ação.

Prado percebe o desconhecido como a marca do futuro, onde podem ou não ser intensificadas perspectivas de sociabilidade entre os grupos humanos. O presente aparenta ser experimentado como curto devido a sensação de aceleração e instabilidade onde se está sempre rumo ao futuro, no entanto, este presente, mesmo breve, está inundado por concepções cristalizadas do passado, pela pressão que muitas das experiências passadas exercem. Neste ensaio, em muitos momentos o tempo é entendido como um processo. Ao fim, para Prado, o presente (e o futuro), mesmo se diferenciando em relação ao que passou, é constantemente invadido pelo passado em movimentos os quais podem ser renegociados a partir de sua tematização, especialmente da escrita da história. É a partir de então que outras experiências podem potencializar o presente em suas ações e realizar algum tipo de progresso.

Referências

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  • FERREIRA, Clayton J. A Noção de Progresso em O Brasil na História de Manoel Bomfim. Expedições: Teoria da História e Historiografia, v. 10, p. 1-19, 2019. nº 3, São Paulo. Disponível em: < Disponível em: https://www.revista.ueg.br/index.php/revista_geth/article/view/9238 >. Acesso em 23/08/2022
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  • GAIO, Henrique Pinheiro Costa. Pessimismo e Ruína: um retrato essencial do Brasil. 2008. Dissertação (Mestrado em História) - Centro de Ciências Sociais, Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2008.
  • GIL, Gilson. Gilberto Freyre versus Paulo Prado: a questão da identidade nacional brasileira. Ci. & Tróp. v. 22, n. 2, p. 211-220, jul./dez. 1994, São Paulo. Disponível em: < Disponível em: https://periodicos.fundaj.gov.br/CIC/article/view/565 >. Acesso em 23/08/2022.
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  • WALLERSTEIN, Immanuel. O universalismo europeu: a retórica do poder. São Paulo: Boitempo, 2007.
  • 1
    A perspectiva temporal acelerada que se relaciona com as transformações das realidades e o progresso como “sujeito transpersonal da ação” se encontram tanto no plano da linguagem cotidiana como na linguagem política científica.
  • 2
    Segundo Martins, essas perspectivas estão associadas ao historicismo, as quais foram, por diversas vezes, confundidas com o positivismo. Este, em uma de suas muitas versões, sacralizou as fontes e os dados obtidos, gerando uma expectativa exacerbada quanto ao objetivismo. No interior destes problemas, a historicização foi entendida, também, como a ideia de que cada experiência histórica é tão restrita e específica que não poderia ser minimamente compreendida ou representada a partir de outra historicidade.
  • 3
    É sempre necessário lembrar e, portanto, não silenciar as diversas violências produzidas a partir do ideal civilizacional eurocêntrico moderno.
  • 4
    Para melhor leitura dos textos que estamos tratando, atualizamos sua grafia.
  • 5
    É preciso apontar que Prado é parte de uma historicidade onde há hegemonia de uma cultura intelectual elitizada, patriarcal e socialmente branca. Mesmo assim, houve a resistência de diversos intelectuais que se encontravam em espaços sociais, étnicos, culturais, econômicos e de gênero diversos, como é o caso dos intelectuais negros Manuel Querino, Theodoro Sampaio, Edson Carneiro e Evaristo de Moraes e das intelectuais Amélia de Resende Martins, Mariana Coelho e Virgínia Cortes de Lacerda. Destaco também que, ainda que Prado tenha escrito em Retrato do Brasil que percebe certa igualdade entre “as raças”, seu ensaio repete o gesto que não confere protagonismo às etnias dos povos originários e dos africanos e afro-brasileiros nos processos históricos da colonização, da monarquia e do regime republicano. Ainda pior, Prado atribui a luxúria exacerbada como característica dos “indígenas”, a qual pensa que teria sido passada aos colonos europeus.

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

  • Financiamento

    Não se aplica
  • Aprovação no comitê de ética

    Não se aplica.

Editado por

Editores responsáveis

Flávia Varella - Editora-chefe Breno Mendes - Editor executivo

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    13 Maio 2024
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    13 Out 2022
  • Revisado
    11 Jan 2023
  • Aceito
    23 Jan 2023
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